sábado, 12 de setembro de 2009

Padres e bispos heréticos?

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Huguet - Santo Agostinho derrotando as heresias
 
Por Prof. Pedro M. da Cruz
 
“Onde houver perigo iminente para a fé, os superiores devem ser argüidos, mesmo publicamente, pelos subordinados.” (Santo Tomás de Aquino)
Escrevendo sobre o Mistério da Omissão em seu Livro “Igreja e Anti-Igreja, Teologia da Libertação”, o autor, Paulo Rodrigues, faz interessantes reflexões sobre a possibilidade de heresia entre Padres e Bispos que, muitas vezes, se julguem superiores ao Magistério da Igreja fundado pelo próprio Jesus Cristo para assegurar a pureza da fé católica.
Os comentários giram em torno do texto paulino de Gálatas (2,11-14) onde São Paulo, sendo inferior em autoridade a São Pedro sobre o qual fora edificada a Igreja, vê-se no direito de criticá-lo e adverti-lo publicamente. Paulo Rodrigues, recorrendo aos ensinamentos universalmente aceitos de Santo Tomás, vai tentar expor da forma mais clara possível, sobre a necessidade de todos os Cristãos, apesar de inferiores aos padres e bispos em autoridade, deverem, em função de seu batismo, defender a verdade proclamada desde sempre pela Igreja universal sempre que for preciso. Mostrar-nos-á, de fato, a necessidade de, algumas vezes, ser imperativo resistirmos publicamente a certos erros que venham a ferir o depósito da fé cristã e causar a ruína espiritual dos cristãos.
“Quando, porém, o termo praelatus (Superior) (...), for referido à pessoa, não de Pedro, mas de um bispo, a aplicação do que ensina Santo Tomás torna-se mais clara – embora permaneça sempre a delicadeza da questão por se tratar de sucessores dos apóstolos - porque traz o aval de inúmeros exemplos históricos.
Se, de um lado, não registra a História o caso de um só papa herege ou cismático, por outro lado abundam – ao lado de muitos santos bispos – exemplos de bispos que não foram fiéis à Igreja e a Jesus Cristo. Senão vejamos:
Representantes do arianismo, heresia condenada pelos Concílios Ecumênicos de Nicéia (325) e Constantinopla (381) : os bispos Acácio, de Cesaréia (†366), e Eunômio, de Cícico (†395). O herege fundador, Ário (256-336), era bispo da Igreja de Alexandria._ Nestório (380-451), herege que fundou o nestorianismo (condenado pela Concílio de Éfeso, em 431) era patriarca de Constantinopla._ Fócio (820-895), que deixou aberto o Cisma do Oriente, era patriarca de Constantinopla. Foi excomungado pelo Papa João VIII, em 881. _ A heresia prisciliana (séc.IV), condenada pela Igreja, vem do bispo de Ávila chamado Prisciliano._ O donatismo (cisma) vem de Donato, bispo de Casa Nigra (África) . _ Ao pelagianismo (heresia que deve o nome ao sacerdote Pelágio, do séc. V) aderiram 18 bispos italianos, dentre os quais o principal discípulo de Pelágio, o bispo Juliano; todos recusaram o anátema do papa Zózimo, na Encíclica Epistola tractoria (418), contra o pelagianismo._ O apolinarismo, heresia condenada por vários concílios, como por exemplo, pelo grande Concílio de Constantinopla (381), vem de Apolinário, bispo de Laodicéia._ O monofisismo, heresia difundida pelo monge Êutiques, de Constantinopla (séc. V), é condenado pelo Concílio de Calcedônia (451). Os bispos egípcios recusam o dogma definido no Concílio (heresia portanto), consideram o monofisismo (ou eutiquianismo) a doutrina verdadeira e partem para o cisma declarado. _ O monotelismo, heresia de Sérgio, patriarca de Constantinopla, condenado pelo VI Concílio Ecumênico (680-681), de Constantinopla. _ O adocionismo e sabelismo, duas heresias professadas simultaneamente pelo bispo Paulo de Samasate, do século III, que foi condenado em 268 no Concílio de Antioquia._ Lutero (1483-1546), pai do protestantismo, era padre._ Jansenismo, heresia condenada pela Igreja, vem de Jansenius, bispo de Yepres; em 1636 deixou para ser impressa sua obra herética Augustinus.
Quietismo, heresia condenada por Inocêncio XI, em 1687, oriunda do padre espanhol M. de Molinos._ Modernismo, afluxo de todas as heresias no princípio deste século, e condenado pela Santa Sé pelo decreto Lamentabili (1907) e pelo Papa São Pio X na Encíclica Pascendi, teve no padre Alfredo Loisy, exegeta e professor no instituto católico de Paris, seu principal iniciador e fomentador. Igualmente o ex-padre jesuíta Tyrrel, na Inglaterra.
Evidentemente, estes exemplos são exceções na história da Igreja. A grande maioria dos sucessores dos Santos Apóstolos foram Bispos dignos e virtuosos, muitíssimos até elevados à honra dos altares. O que pretendemos é chamar a atenção do leitor adulto para os tempos terríveis que vivemos hoje, em que, por toda a parte, surgem novos ários, novos nestórios, novos pelágios, novos modernistas, e conclamar o leitor adulto para o ensinamento perene de Santo Tomás naquele difícil mas obrigatório ad secundum: ‘Onde houver perigo iminente para a fé, os superiores [praelati] devem ser argüidos, mesmo publicamente, pelos subordinados.’_ como outrora o povo fiel, com São Cirilo de Alexandria, aclamava nas ruas contra o patriarca Nestório: Theotókos! Theotókos! Mãe de Deus!”1
Este texto faz-nos recordar algumas palavras do Papa Bento XVI ainda Cardeal. Ele nos afirmava, com referência aos hereges do tempo moderno, que os mesmos “... não pretendem aparecer como tais.” Afinal, o próprio Cristo já nos precavia contra os lobos que apareceriam astutamente disfarçados em pele de Cordeiro. Vejamos:
Eu fico cada vez mais admirado com a habilidade dos Teólogos que conseguem defender justamente o oposto do que se encontra claramente escrito nos documentos do Magistério. E, no entanto, aquelas deturpações são apresentadas, através de hábeis artifícios dialéticos, como o ‘verdadeiro’ significado do documento em questão.”2 (J. Ratzinger)
Virgo Potens, ora pro nobis!

1 RODRIGUES, Paulo. Igreja e Anti-Igreja. Teologia da Libertação. São Paulo, T. A. Queiroz, Editor, 1985, pg. 265 – 267 (n.n.)
2 RATZINGER, Joseph; MESSORI, V. A fé em crise? O Cardeal Ratzinger se interroga. Trad. Pe. Fernando J. Guimarães, CSSR. Sâo Paulo, E.P.U, 1985, pg. 14 (n.n)